segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

A viagem invisível aos outros...




Sentado numa cadeira confortável e espaçosa na primeia classe de um avião ia Amadeu em direcção a Lisboa. Tivera uma reunião bastante importante e deveras cansativa. Ansiava por aquelas horas, sentado e descansado sem ter que raciocinar. Teria apenas que voar tranquilo e acordar na aterragem.
Ao seu lado tinha um pai com três crianças que não paravam de correr, saltar e rir. Tocavam no botão que chamava as hospedeiras de bordo e entre risos escondiam-se, fugiam e pulavam entre as cadeiras.
Exausto e ansioso por dormir Amadeu levanta-se e bruscamente dirige-se ao pai das crianças reclamando o seu direito de paz e sossego naquelas duas horas de voo!
De forma indelicada e rispída mostra o seu desagrado e saturação!Insulta o pai e põe em causa a educação daquelas crianças! Chama as hospedeiras e exige uma atitude!
O pai das crianças cabisbaixo acena com a cabeça concordando e aceitando a revolta de Amadeu diz-lhe apenas de coração destroçado:
-"São meus filhos! Têm 5, 7 e 9 anos. Acabaram de perder a mãe e por isso talvez não tenha coragem de neste momento lhes retirar a alegria e entusiamo de estarem a voar! Talvez não seja capaz de os mandar calar e lhes roubar o sorriso e brilho nos olhos que tanto preciso ver!
Peço desculpa mas hoje não o farei...hoje vou deixá-los rir, cantar e pular! Vou deixá-los aproveitar ao máximo todos estes minutos de entusiasmo e alegria! "
Amadeu ficou petrificado! Lentamente e fora dele recuou não sabendo bem onde pôr os pés! Por segundos parecia que uma janela se tinha aberto e o sugava lentamente para fora do avião!
Suplicou a ele próprio para não ter feito o que fez, não ter dito o que disse, não ter julgado sem saber...
Os gritos, os pulos, as gomas a voarem entre cabeças, as gargalhadas entusiastas deixaram de lhe rosnar nos ouvidos! De repente sentiu-se estupidamente pequeno e ridiculo!
Surgiu nele a vergonha e vontade de também com eles gritar, pular, cantar e abraçá-los porque realmente a vontade dele de descansar poderia ser adiada para dali a umas horas mas o amor de uma mãe não estaria à espera deles quando aterrassem! O calor e companhia da mulher não estaria em casa à espera para os receber! Aquela família ia aterrar numa nova vida...

Somos tantas vezes Amadeus! Julgamos os outros tantas e tantas vezes sem pensarmos antes! Não nos pomos no lugar do outro e ocupamos apenas o nosso! Criticamos e banimos o desconhecido ou o mais próximo sem antes nos questionarmos do porquê? Como? Quando?

Esquecemo-nos que a realidade dos que amamos e estão perto de nós nem por isso é igual á nossa!
O nosso avião pode ser o mesmo mas a nossa viagem é diferente porque também nós o somos!
Há que aceitar a viagem a que Deus nos propõe porque é única, é nossa mas pode-se tornar mais fácil e suave se quem se sentar nas cadeiras ao nosso lado a tentar compreender!

Só assim irão aceitar ausências e gargalhadas! Só assim viajarão connosco e não cairão no erro de julgar o que felizmente não vivem...e quando o viverem quem já viajou naquele avião saberá certamente compreendê-los e aceitá-los.