terça-feira, 5 de março de 2013

Aperitivos no Tempo!




"O tempo cura tudo..."

Já todos o ouvimos, já saíram da nossa boca entre lamúrias e ânsias de esperança estas simples quatro palavras com tanto peso num futuro.
Não acho que o tempo cure tudo. A distância do ponto de partida é que nos liberta na descoberta de novos horizontes cheios de novos pontos e conquistas mas a marca permanece. Talvez por ser vista à distância pareça mais pequena mas tal como o astronauta acabamos sempre por regressar aquele ponto pequeno que é a Terra.

Em miúda fui atacada por um cão que era meu desde pequena. Não penso nisso todos os dias mas cada vez que por acaso passo com os dedos no pescoço junto à orelha, sinto aquele alto e imediatamente volto para aquela tarde e recordo como se fosse hoje!
Hoje relembro e revejo tudo com outro olhar. Imagino o pânico de quem estava comigo, o susto de quem me abriu a porta e o olhar terno e preocupado de quem me tratou.
As minhas cicatrizes na cara passaram, o respeito por cães daquela raça mantem-se e a consequência de ter sido abatido depois de ter atacado novamente alguém deu-me uma espécie de alívio com uma profunda tristeza. Afinal aquele tinha sido o amigo que me acompanhara na fase mais difícil da minha criancice.
O tempo remediou a falta dele com outras coisas mas passado tantos anos a marca no pescoço permanece e ativa o que está no coração!

O tempo não cura, não apaga, distância-nos de tal maneira que com a serenidade necessária conseguimos olhar e perceber, rir ou chorar, amar ou duvidar, questionar ou admirar o que fomos!
O tempo dá-nos a hipótese de com calma nos irmos conhecendo e aprendendo com aquilo que já passou mas marcou!
Estende-nos uma bandeja com vários aperitivos de nós mesmos prontos a serem retirados quando e onde quisermos. Dá-nos a possibilidade de vermos que somos muito e muito mais!
Porque o tempo passa mas não cura, acentua o que mais falta faz e que por mil razões e galáxias de distância nunca será entendido porque no coração as leis da perceção, análise e equilibrio não funcionam!

O tempo é a nossa cortisona, disfarça uma dor que ao mínimo toque volta a surgir! Ou o aproveitamos enquanto estamos bem para encontrarmos a raiz dos nossos males ou passaremos uma vida inchados e ressacados de falsos eu´s mascarados com o passado que o tempo não curou...

Não temos nem devemos viver no passado ou pelo contrário fugirmos dele, podemos aprender com ele!
Afinal, a bandeja a ser servida só é realmente completa, bonita e genuína com todos os aperitivos, com todos os pontos que mesmo distantes no passado nos marcaram e nos foram tornando quem somos!